Download e Leitura Online (link direto)
Download (mediafire)
Leitura Online (mediafire)
Disclaimer:
“Other World” é uma web-série independente, cuja a autoria
pertence à Lilian Kate Mazaki, publicado originalmente no blog
http://otherworld-serie.blogspot.com.br
Other
World – Capítulo 16
O
Lado de Fora
por Lilian Kate Mazaki – abril
2014
Juliana se jogou na cama da qual havia se levantando a pouco mais de
dez minutos. Estava completamente vestida para ir tomar café, mas de
repente seu plano costumeiro havia sido interrompido por uma simples
troca de palavras:
― Você fez aquele site? ― perguntou a ruiva, com as sobrancelhas
franzidas, encarando o teto branco do quarto.
― Olha, não precisa ficar tão chocada assim, Julie. ― disse
Mari Ritcher, ainda sentada em seu próprio colchão. O jaleco do
uniforme da área de engenharia da OMM que programadora trajava
estava tão amassado que era óbvio que ela havia dormido com ele.
Era manhã de segunda-feira, início da terceira semana corrida de
treinamentos do futuros Soldados Delta. Durante o fim de semana os
estudantes tanto do grupo dos futuros soldados como os que faziam
apenas a preparação teórica haviam sido sacudidos por uma
novidade: um website capaz de rankear as habilidades dos soldados,
apartir de todas as pontuações particulares obtidas durante os
treinamentos.
O acesso era livre para todos os estudantes que participavam do
Programa de Treinamento do Soldados Delta, seja na parte teórica ou
prática. Não havia registro de vazamento dessas informações para
ninguém fora da OMM, o que parecia ser o que retardava a iniciativa
da organização de buscar os responsáveis pelo hackeamento e
montagem do sistema. A ferramenta era tão completa que era possível
cada soldado comparar seus pontos com algum colega em especial em
algum tipo específico de exercício, para qualificar quem tinha mais
aptidão:
― Eu só. . . ― a voz de Juliana era hesitante. ― Achei que
você me diria se tivesse feito.
― Mas essa é a primeira vez que nós vemos direito desde o sábado!
Dormi nos laboratórios e vim ontem aqui trocar de roupa e tomar
banho durante a tarde, quando você estava em treinamento. ―
explicou Mari. ― Acho que hoje não vou ir pro treinamento teórico
coisa nenhuma. Vou acabar entrando em coma se não dormir mais de
duas horas seguidas.
Juliana não respondeu nada a este comentário, mas também não fez
menção de se levantar de novo. Ela ainda estava digerindo a
história do website com certa dificuldade. Isso porque a principal
ferramenta, e também mais acessada, era o "ranking geral",
que comparava todas as pontuações de todos os soldados e gerava uma
lista atualizada em tempo real, classificatória do número um ao
duzentos e cinquenta.
E Juliana Lake era o nome que estava metade do tempo na primeira
colocação. Na outra metade o que constava era Fábio Ivanoff.
― Olha, Julie, não precisa encarar isso como se fosse uma
tragédia, porque não é. ― começou Mari, incomodada com a
capacidade nata da outra de não falar nada quando precisava falar
alguma coisa. ― De primeira eu só ouvi a idéia do Barbosa Júnior
porque ele bajulou minha habilidade de hacking, mas depois eu acabei
vendo alguma coisa de boa nessa de criar o site.
"Primeiro, claro, porque isso me permitiria hackear a OMM sem
que eles me condenassem à cadeira elétrica. Não mesmo. A
ferramenta é útil e estimulante para os recrutas. E também, se
forem bobear comigo eu vou meter o filho do chefe na encrenca."
"Mas também teve uma coisa que o Thiago me falou. Ele é um
garoto um tanto afobado e energético demais. Imagino se ele não
tivesse sido tratado desde bebê por causa de hiperativismo, nossa.
Enfim, ele disse que gostaria muito de saber qual era a posição
dele no ranking, para assim os outros respeitarem ele como soldado,
não só como o filho do General da OMM."
Juliana desistiu de fintar o teto e encarou de lado a loira, quando
ela terminou e dizer aquilo. A leve mudança na expressão desta fez
Mari acreditar que estava indo no caminho certo:
― Você não tem que se preocupar se vão falar de você pelos
cantos, Juliana. Se você é assunto para eles é porque tem uma
habilidade incrível, invejável. Eles vão te respeitar quando
estiver com eles. Você está encarando isso da maneira errada.
― Você fez isso por mim? ― perguntou a ruiva, com uma expressão
de estranheza.
― Ora, vamos, somos amigas. Hackear e criar o site é algo simples
como cortar pão pra mim. Eu me divirto muito em sacanear a OMM e
ainda tem esse benefício: ajudar a levantar essa sua estima tão
baixa. ― declarou a programadora, com um sorriso abatido, devido ao
cansaço. ― Estou quase te adotando, Julie. Quero que seja minha
irmãzinha caçula.
― Nem ferrando. ― riu-se Juliana. Mari decretou vitória
internamente. ― Como poderia uma irmã ser loira e outra ruiva?
― Ah, o mundo tá tão globalizado, Julie. Todo mundo tem um
sobrenome latino e outro europeu, asiático, americano. Você está
sendo muito cafona.
As duas deram risadas e Juliana enfim pôs em pé. Mari por sua vez
se atirou nos seus travesseiros e só disse algo que soou como "tenha
um bom dia" apesar de ser impossível ter certeza, já que esta
pareceu adormercer quase instataneamente.
Juliana respirou fundo e partiu para o desjejum. Aquele prometia ser
um dia muito mais do que "bom". A verdade é que a, tirando
toda o seu nervosismo costumeiro em relação as outras pessoas, ela
estava ansiosa como nunca pelo que viria.
Mais uma vez o grupo de duzentos e cinquenta recrutas que se
preparavam para tornar-se Soldados Delta estava reunidos no salão de
treinamento do bloco A da base. Todos usavam os trajes
roxo-acinzentado, mas dessa vez traziam um item a mais consigo: o
fino cordão metálico que era a base dos capacetes transparentes de
tecnologia avancadíssima. Todos estavam parados em fileiras
organizadas, como já haviam se acostumado naquelas últimas semanas.
Nadia Rock entrou com passadas vigorosas, como era de seu feitio e
postou-se à frente da tropa:
― Boa tarde, recrutas. Hoje, como vocês já sabem, iremos realizar
uma importante atividade do Plano de Treinamento dos Soldados Delta:
vamos explorar o ambiente externo da base.
O silêncio dos jovens permaneceu intocável, mas era claro aos olhos
da instrutora a excitação que existia dentro de cada um. Evitou
sorrir, mas aquela aura fazia seu trabalho ser perfeito para ela a
cada dia:
― Certo. Agora quero que coloquem os cordões do capacete protetor
em volta do pescoço. Observem como o faço e repitam até que
consigam realizar o movimento com perfeição.
Tendo dito isso, Nadia pegou seu próprio cordão e o encaixou no
pescoço. O mesmo acoplou-se a camada externa do traje e logo a
membrana transparente que garantia a sobrevivência humana diante da
atmosfera do Outro Mundo se completou, assim como a extensão do
tecido do traje, cobrindo os cabelos da mulher.
A execução não era nada complexa, precisando apenas de uma ou duas
tentativas para que todos tivessem com a proteção devidamente
instalada.
"O status do capacete de cada uma de vocês está sendo
monitorada pelo HNI de vocês, integrado aos sistemas da OMM,
portanto, não precisam se preocupar em alguma falha ou mau encaixe
do capacete." disse Nadia caminhando em direção a parede feita
de puro vidro com mais de três metros de grossura. "Ainda que
pareça imóvel, esta proteção de cada um dos salões de
treinamento foi configurada para ser também uma rápida passagem
para o lado de fora. Vejam só, nossa equipe de apoio já está lá
nos aguardando." disse, apontando para o exterior e os jovens
não conseguiram conter suas exclamações de surpresa e admiração.
O instrutor Basil McKeen estava no lado de fora da base, sob as
areias do deserto que cercava toda a construção. Estava posicionado
ao lado de um veículo semelhante a um Jipe, com rodas adaptadas e
uma membrana de tom avermelhado no lugar dos vidros laterais e capô.
Ele acenou para Nadia, que retribuiu:
― Escutem, quando eu der o comando e a parede se abrir diante de
nós, cada um de vocês irá caminhar até o instrutor Basil e ouvir
o que ele tem a lhes dizer antes de prosseguirmos. Dividam-se em
grupos de três ou quatro para isso. Preparados?
Juliana, Thales e Leonardo sempre se posicionavam próximos para a
realização das atividades e nem precisavam combinar nada para se
organizar. Logo havia uma fileira de pequenos grupos, esperando a
ordem da instrutora Rock:
― Certo. Vamos lá. ― disse Nadia Rock e, sem que ela fizesse
qualquer ação, parte do vidro de mais de três metros de grossura
desceu com uma suavidade impressionante.
Vento e um pouco de areia adentraram ao salão e alguns dos recrutas
recuaram. Do primeiro grupo na fila, apenas Fábio Ivanoff não
esborçou qualquer reação ao primeiro contato da atmosfera do Outro
Mundo com seu traje.
Nadia deu o sinal e o grupo avançou em uma corrida leve. Muitos
observaram com receio, com se acreditassem que algo poderia dar
errado nos filtros. Eles sabiam que se não estivessem protegidos
pelos trajes seus corpos seriam esmagados pela pressão e seus
pulmões iriam ser tomado de partículas mortais em questão de
segundos.
Para a surpresa geral, quando o grupo alcançou o instrutor Basil, ao
invés de retornar, eles se dispersaram pelas redondezas, sem muito
objetivo. Fábio Ivanoff foi o único que manteve uma trajetória em
marcha reta, quase desaparecendo de vista quando o segundo grupo
chegou ao veículo.
Conforme iam passando os grupos, a instrutora Nadia dava tapinhas nas
costas de alguns dos recrutas. Foi o caso de Thiago Barbosa e Daniel
Ivanoff. Quando o grupo de Juliana enfim chegou na ponta a ruiva se
surpreendeu com o peso sobre o seu ombro esquerdo:
― . . . ― Juliana virou o olhar para encarar a mulher que apenas
sorriu para ela. ― Vão.
Quando Juliana colocou ambos os pés sobre a areia e o brilho do céu
sem claro, porém sem sol, chegou à membrana do capacete, Juliana
pode ter a sensação perfeita do ambiente. Mesmo que houvesse uma
barreira, ela era capaz de escutar o ar e sentí-lo correr pelo
traje. Ela, Thales e Leonardo seguiram o exemplo dos outros grupos e
foram correndo sem tanta pressa até Basil. O magricela Thales não
conseguia se conter em silêncio:
― É incrível, é incrível! ― exclamava ele, sem se direcionar
a ninguém. Sua expressão denúnciava seu êxtase.
Foram precisos só três minutos para que alcançassem o veículo. O
instrutor com o qual pouco tinham contato os encarou com um sorriso
que ainda não tinham visto em seu rosto:
― Sejam muito bem vindos, Soldados Delta, ao Outro Mundo. ― disse
ele.
― O-Obrigado, instrutor! ― respondeu Thales, emocionado.
― Este lugar só foi pisado por poucas centenas de seres humanos. É
um mundo a ser descoberto por vocês, pelo bem de toda a humanidade.
― continuou Basil. ― Explorem um pouco dos arredores, livremente.
Acostumem-se com isto. O HNI está monitorando seus organismos.
Qualquer alteração e iremos colocá-los em segurança. Agora
aproveitem. Vocês tem trinta minutos.
Os três se encararam e Thales tomou a iniciativa de tomarem a
direção esquerda. Leonardo e Juliana o seguiram sem hesitar:
― Nossa, isso é demais, não é? ― disse ele. As vozes eram
enviadas de um para o outro usando o sistema básico de ligação e
conferência do HNI, que permitia que pessoas em locais distante do
mundo, ou só protegidas por capacetes pudessem falar como se
estivesse ao redor de uma mesa.
― É um pouco quente. Imagino que deva ser bem pior sem essa roupa.
― disse Leonardo.
― Querem correr? ― perguntou Juliana.
― O que? Você sugerindo uma corrida, Julie?! Caramba!
― Não precisa falar como a Mari. ― retorquiu a garota e os
outros dois se divertiram.
― Você está mesmo empolgada com isto, não é? ― perguntou
Leonardo.
― Ora, vamos nessa. O Fernando Alabart já fez tanta palhaçada lá
do outro lado que acho que o Sistema Delta está mais do que testado
na prática! ― disse Thales, dando pulos de ansiedade.
― Até o carro? ― sugeriu Juliana.
― Feito! ― respondeu Leonardo.
― 3, 2, 1. . . Já!
Os três sairam em disparada, percebendo a dificuldade maior de se
locomover na areia fofa. Porém logo Juliana foi pegando o jeito e
deixando os outros dois para trás com facilidade. Ela venceu todas
as cinco voltas completas num raio de dez metros do jipe que
apostaram:
― Espere só voltarmos para a Terra! Eu terei minha vingança! ―
exclamou Thales, levemente ofegante quando finalmente os dois amigos
alcançaram a ruiva, que os esperava apoiada no veículo do instrutor
Basil.
― Eu nem sei o que é correr sem esse traje. É covardia. ―
reclamou Juliana.
O restante do tempo passou muito rápido na opinião da orfã e logo
eles tiveram que retornar para o salão, onde a maioria dos grupos já
estava de volta. As conversas estavam altas até que a instrutora
Nadia fechou a passagem para a atmosfera do Outro Mundo e anúnciou
que cada um teria que passar por uma limpeza, assim como todo o
salão. Iria levar cerca de duas horas até pudessem continuar com os
treinos.
A desinfeção era individual, realizada em uma pequena antecâmera
que havia em uma das saídas do salão. Jatos fortes de ar e lasers
corriam toda a superfície do corpo do soldado e o ambiente era
testado oito vezes antes que o mesmo fosse liberado para voltar para
o corredor anexo ao salão.
Cada um dos duzentos e cinquenta soldados fizeram suas limpezas e
puderam livrar-se dos capacetes enquanto aguardavam o término da
limpeza do ambiente de treinamento. As conversas eram animadas. Todos
trocavam suas experiências naquela meia hora de exploração.
Juliana limitou-se a ficar pensativa a um canto.
Havia um misto de emoções no coração da jovem quando enfim a
porta principal do salão de treinamento foi liberada e todos se
direcionaram para a retomada dos exercícios marciais. Seu coração
chegou a dar um salto no peito quando o deserto se fez ver através
da grossa camada de vidro blindado.
Ela não sabia definir o que era aquele sentimento forte que parecia
se alastrar por seus pulmões e cérebro. Tinha certeza de que não
eram partículas alienígenas, afinal o sistema era seguro. Mas o
aperto e descarga de adrenalina poderiam ser identificadas quase como
uma contaminação.
Afinal, ao observar as areias agora inalcançáveis, Juliana Lake
teve certeza de que não era mais ali dentro na proteção, mas sim
lá fora, o seu lugar certo de estar. O Outro Mundo era o ambiente
para o qual ela havia sido feita para habitar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário