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Disclaimer:
“Other World” é uma web-série independente, cuja a autoria
pertence à Lilian Kate Mazaki, publicado originalmente no blog
http://otherworld-serie.blogspot.com.br
Other
World – Capítulo 15
Repercussão
por Lilian Kate Mazaki – abril
2014
A sessão de saltos se prolongou por toda a tarde e todos estavam
exaustos quando Nadia Rock finalmente os liberou para o jantar. Ainda
que o cansaço fosse unânime, pouco a pouco conversas excitadas
foram sendo cochichadas pelos corredores de todos os cinco pavilhões
de treinamento da base humana no Outro Mundo.
E era sobre Juliana Lake que quase todas essas conversas falavam.
Depois do feito inesperado da jovem, diferente da reação de
explosão que os recrutas haviam tido com o salto de Fábio Ivanoff,
o silêncio foi o que sobreveio. A instrutora Rock foi a única que
pareceu genuinamente entusiasmada.
Nas sessões de salto seguintes todos ficavam sempre muito atentos
quando os recordistas iam executar suas tentativas. Juliana não mais
conseguiu a façanha dos trinta e sete metros, na verdade nem mesmo
conseguiu passar Fábio Ivanoff, que se esforçou ao máximo em cada
salto, tendo somente igualado a marca dos seus trinta metros mais uma
vez.
Os mais desejosos por melhores desempenhos acabaram concluindo que
Juliana Lake tivera apenas uma sorte excessiva da primeira vez.
Thales e Leonardo evitaram comentar qualquer coisa sobre o salto de
Juliana durante a volta para o bloco B. Encontraram Mari, com uma
expressão de exaustão genuína, já sentada à uma das das largas
mesas do refeitório, porém pareciam esperá-los para servir-se:
― Ei, meus soldadinhos, parece que se esforçaram bastante hoje. ―
comentou ela quando os três se aproximaram o bastante.
― Mas aposto que minha cara não está tão acabada quanto a tua,
cracker. ― comentou Leonardo com o alguma diversão em importunar.
― Não é pra menos. Eu não entendo esse pessoal da Computação.
Às vezes tenho a impressão de que sou eu a doutorada, não eles. ―
reclamou a garota.
― Vamos comer, antes que eu desmaie aqui mesmo! ― disse Thales.
Os quatro se serviram de porções generosas e voltaram ao lugar:
― Julie, sei que você é uma pessoa um tanto modesta, mas queria
te avisar que todos na OMM já sabem do seu feito do dia. ― disse
Mari, antes de começar a comer.
Juliana parou com o garfo no ar, a caminho de levar uma porção de
massa para a boca e franziu a testa para a loira. Pousou o talher:
― Er. . . ― resmungou Thales, incomodado.
― O que foi? Achei estranho vocês não virem comentando sobre
isso. ― disse Mari. ―"Nossa! Eu não consegui acreditar nos
meus olhos!" Ou algo assim. ― completou ela, fazendo uma
imitação do jeito entusiasmado de sempre de Thales.
― Ela só fez uma vez. Deve ter sido uma sorte de principiante. ―
respondeu Leonardo, evitando olhar para Juliana.
― Sabe, foi estranho. ― disse Thales em tom de confissão. ― O
salto do Ivanoff tinha sido incrível, mas ele já tem essa postura
superior, sabe. Ninguém esperava que a Julie fosse fazer algo tão.
. . tão.
― Você ficou assustado com um pulo, é isso mesmo, Thales? ―
questionou Mari, com uma expressão de choque. ― Fala sério, eu
achei que tinha sido um gol da seleção quando gritaram lá no
departamento de computação.
― Gritaram? ― perguntou Juliana, insegura.
― Sim, Julie! Claro que eles não deviam ficar assistindo os
treinamentos, mas todos estão muito curiosos. O seu salto foi
formidável, um verdadeiro feito do Sistema Delta. E seu também.
― Ah. . . ― Juliana quis agradecer pelas palavras da amiga, mas
estava sem jeito demais para isso.
― É proibido vazar qualquer informação do treinamento para o
povo, mas tenho certeza de que vão comentar sobre isso na internet.
Já já vão estar comparando isso com o primeiro robô de exploração
pousando em Titan!
― Ótimo. . . ― gemeu Juliana, se encolhendo sobre o prato e
voltando-se apenas para sua comida.
Em uma mesa afastada dali o grupo de amigos centralizado em Thiago
Barbosa também falava sobre o assunto predominante:
― Incrível, essa Juliana Lake. Eu fiquei sem palavras quando ela
fez aquele salto! ― comentou o filho do General Barbosa. Assim como
na outro grupo os pratos generosamente servidos predoninava entre os
novos soldados.
― Será que ela é mesmo boa assim? Afinal ela só fez uma vez. ―
questionou o pequeno Fernando, parecendo mais confortável em voltar
a utilizar seu boné.
― Mesmo que só tenha saltado trinta e sete metros uma vez, todos
os outros saltos dela foram melhores que os nossos. ― ponderou
Matheus.
― É realmente incrível! ― exclamou Daniel Ivanoff. ― Digo,
meu irmão pareceu sentir-se desafiado por aquela garota, a Lake. Eu
nunca o tinha visto com aquele olhar.
― Seu irmão parece ser o tipo de cara muito competitivo, Dani. ―
comentou Milene Wood. Apesar de as atividades da tarde estarem
divididas agora, a noite todos os amigos que já se conheciam se
reuniam novamente para o bate-papo. ― Você não tem nenhum
problema com isso?
― Problema? Não, não. ― respondeu Daniel, um tanto incerto.
― Matheus. ― chamou Sarah, que estava mais uma vez sentada do
lado direito do rapaz.
― Sim, Sarah? ― respondeu o loiro, já sentindo o costumeiro
nervosismo brotando no fundo do estômago.
― Os seus resultados foram muito bons, não é mesmo? Deve estar
feliz.
― É, estou satisfeito sim. Acho que iria orgulhar meu pai.
― Matheus. . . ― Sarah ficou surpresa, pois o rapaz nunca
mencionava o seu falecido pai, ainda que fosse um filho próximo a
Jonanthan Alabart antes da morte prematura deste.
Distraído, Matheus ouviu seu nome ser dito pela amiga e virou o
rosto para encará-la, fazendo os dois cruzarem o olhar sem falar
nada por um momento. Quando perceberam isso ambos viraram e se
ajeitaram nos acentos, parecendo querer muito prestar atenção na
conversa que seguia:
― Queria que tivesse um modo de saber quem é mais habilidoso com o
Sistema Delta. ― ia dizendo Tiago. ― Sabe, colocar algo meio que
oficial.
― Mas Tiago, os soldados não são competidores. Isso não é um
esporte, é um treinamento. ― repreendeu João, parecendo
horrorizado com a ideia do amigo.
― Ah João, cê é muito pacífico mesmo! Não entende que se tiver
um clima de competição todos vão querer melhorar para ficar na
frente? É uma ideia e tanto!
― Não consigo discordar. ― disse Daniel, levando a mão ao
queixo num gesto de reflexão.
― Seria maneiro, Tiago! Eu iria fazer o máximo para superar você
e meu irmão! Quero ser o melhor! ― declarou Fernando, sem qualquer
constrangimento por sua ambição.
― Melhor que o Fábio Ivanoff, Fernando? ― perguntou Matheus, não
resistindo a dar uma dose de realidade no caçula.
Fernando respondeu com um gesto nada elegante, mas esperado do gênio
explosivo do mesmo. Matheus o ameaçou, mas a discussão dos dois
ficou por isso mesmo.
Na manhã da sexta-feira da primeira semana de treinamentos na base
humana no Outro Mundo, Juliana Lake levantou-se com uma notícia que
fez seus ânimos, normalmente invariantes, afundar. Foi Mari quem lhe
trouxe a informação, durante o trajeto já típico de ir ao
refeitório para o desjejum:
― Um vídeo? ― repetiu Juliana, com a voz fraca.
― Isso. É terminantemente proibido divulgar qualquer material do
treinamento dos Soldados Delta para fora desta base, por causa de
todos os problemas políticos. Mas parece que algum engraçadinho sem
muita noção fez uma cópia da gravação e, usando uma rede anônima
de dentro da própria sede subiu o vídeo no site de streaming mais
acessado do mundo. ― relatou Mari, que parecia um tanto irritada
com a situação. Hoje suas olheiras de cansaço estava bem mais
amenas do que anteriormente.
― Em pleno século vinte e três e a segurança continua a mesma
coisa do século vinte. ― disse Juliana, expressando muito bem sua
amargura.
― Não sei se isso te deixa melhor ou não, mas o vídeo está
sendo um sucesso astronômico na internet. Até o fim da tarde vai
ser o assunto mais comentado em todas as redes e portais de notícias.
― Só as caras que os outros fizeram pra mim naquela hora já tinha
sido ruim o bastante, Mari.
― Isso é algo que eu não entendo! Por que diabos alguém iria
achar ruim uma marca impressionante que você e o Sistema Delta
atingiram juntos? ― volciverou a hacker, quando enfim chegaram ao
refeitório. As duas rapidamente se serviram e sentaram em uma mesa
onde já estava ficando acostumada a comer.
― Eu sei lá o que os outros pensaram. ― disse Juliana, encarando
o sanduíche que pegara. ― Só sei que as pessoas já me achavam
uma esquisita desde antes, antes de tudo acontecer. Agora vai ser
mais ainda.
― Eu também te achava uma esquisita. ― disse Mari, depois de
tomar um gole do café com leite, encarando o deserto pela larga
janela ao fundo. ― Na verdade nem sei quando deixei de achar isso,
Julie. Você é uma pessoa difícil de entender.
― Obrigada.
― Ei, não precisa se desanimar desse jeito. ― disse a loira. ―
Você não é uma pessoa estranha de verdade. Eu e os garotos já
estamos habituados a você e sabemos que é tão gente quanto
qualquer um, só é quase muda.
― Estão falando de nós? ― perguntou Thales. Ele e Leonardo
vinham chegando com as bandejas de café da manhã já preenchidas.
― É que nossa amiguinha metade-fantasma está precisando de uma
dose de ânimo hoje. ― esclareceu Mari.
― Por causa do que aconteceu ontem ainda? ― indagou Leonardo. ―
Não fica com essas coisas na cabeça não, Juliana.
― Parece que o vídeo vazou pra internet, né. ― comentou Thales,
meio receoso. ― Isso piora um pouco.
― Esperem, eu estou chocada demais neste momento.
― O que foi, Mari? ― perguntou Thales, distraído do seu
raciocínio.
― Nunca imaginei que o Leonardo tinha o dom de ser gentil com
alguém. Fiquei abismada como nunca!
― Ah, vá. . . ― xingou o moreno, voltando ao seu mal humor
típico.
Os treinamentos daquele dia e dos posteriores seguiu sem que novos
acontecimentos incomuns fossem motivo de grande falatório. Juliana
teve que aguentar muitos olhares por todos os lugares que passasse,
ainda que isso não tivesse mudado o fato de que ninguém além do
grupo que já estava acostumada se aproximava para trocar qualquer
par de palavras. Seu desempenho continuava excelente nos treinamentos
teóricos e práticos, tendo sempre Fábio Ivanoff como comparativo
para suas marcas visíveis.
No fim da segunda semana das oito totais do Plano de Treinamento dos
Soldados Delta os jovens habilitados já estava aprendendo técnicas
de sobrevivência mais avançadas e se preparavam para pisar pela
primeira vez no ambiente externo do Outro Mundo.
Durante esse meio tempo os jovens haviam aprendido a verificar os
números associados a cada um dos seus exercícios e práticas, que
eram registrados em banco de dados com acesso individual. Os mais
próximos comparavam seus números e tentavam quantificar um total
para saber quem seria o "melhor" do grupo, segundo
critérios que eles próprios definiam de superioridade.
Thiago Barbosa era um dos que mais realizava essa prática, mas a
dificuldade de computar as informações e fazer um cálculo justo de
comparação o frustravam. Foi buscando uma solução para essa
questão que ele falou com diversas pessoas e chegou a decisão de
comer apenas uma barra de chocolate no intervalo do almoço do sábado
para buscar nos corredores pela pessoa que havia achado como ideal
para ajudá-lo.
Mari Ritcher estava com uma aparência particularmente péssima
naquele dia. Sem tempo para fazer as refeições a hacker se
desdobrava para atender os pedidos do setor de computação da sede
na Terra e ainda debruçava-se sobre os manuais que gerenciavam o
sistema de proteção absoluto que cercava o Portal que ligava as
duas dimensões.
No começo de tarde ela estava se encaminhando para o portal mais uma
vez, para atender a uma solicitação urgente de um Engenheiro com
pós-doutorado que não conseguiam encontrar os acessos corretos para
verificar o andamento de testes em um novo protótipo para uso dos
Soldados Delta. Ela estava tentando ler uma thread de fórum enquanto
avançava a passos rápidos pelo corredor quando quase esbarrou em
alguém que cruzou seu caminho de repente:
― Mari Ritcher?! ― exclamou o rapaz de cabelos castanhos e rosto
alongado.
― Caramba! Quase você me mata de susto! ― reclamou a garota. ―
Sou eu sim, o que há?
― Ah, meu nome é Tiago Barbosa. Eu sou um dos recrutas dos
Soldados Delta. ― apresentou-se o rapaz, acalmando-se um pouco.
― Sim, eu sei quem você é. ― disse Mari, observando-o melhor. ―
Sou amiga do seu pai sabe.
― Meu pai? ― estranhou Tiago.
― Longa história. O que quer falar comigo, Tiago?
― Ah! Bom, é sobre uma ideia, para algo que pode ser útil para os
Soldados Delta. Eu ouvi falar que você faz coisas para OMM, né.
― Faço sim. . . Tenho feito mais coisas pela OMM do que pela minha
alma nos últimos dias.
― Então, é sobre as pontuações que nós, futuros soldados,
conseguimos durante as atividades, sabe. . .
― Olha, Tiago, eu estou com pressa. Quem sabe outra hora você me
procura e-
― Espera, espera! Não quer sentar nem um pouco para me ouvir?! Eu
tenho um pouco de chocolate aqui, não quer dividir?
― Fico tentada pelo cholate, mas. . .
― Me disseram que você é o hacker mais poderoso que eu poderia
encontrar.
Mari esticou o braço e pegou a metade de barra que Tiago segurava:
― Por que não conversar, não é mesmo?
― Como é?! Seu irmão conseguiu uma namorada?!
Fernando e Daniel e Carla Steins estavam sentados em uma das cabines
ao redor das mesas do salão de estudos do bloco B. Era noite, após
o horário do jantar e os três conversavam sobre qualquer coisa para
distrair-se da rotina cansativa:
― Sim, e eu também fiquei surpreso. É uma garota com cara de
estudiosa, lá do bloco E. Ela não é da turma dos soldados nem
nada.
― Seu irmão teve sorte, né. ― comentou a pequena Carla.
― Que nada! O cara é um monstro, isso sim! Ser o melhor dos
Soldados Delta e ainda descolar uma garota! Ele é o cara! ― disse
Fernando, admirado.
― Não sabia que queria ter uma namorada, Fernando. ― brincou
Daniel, rindo-se com Carla da expressão de desconcerto do outro.
― N-Não é isso! Eu ainda quero aproveitar muito a vida antes de
me incomodar com mulheres!
― Isso aí, machão. ―
zombou Carla.
― Além disso. ― começou
Daniel, um pouco mais sério. ― Ninguém tem como ter certeza de
que meu irmão é o melhor Soldado Delta.
― Claro que é, Daniel! Olha
as manobras que ele faz! Os golpes, as esquivas! ―
contra-argumentou Fernando.
― Pra mim o Tiago, o seu
irmão e aquela Juliana Lake estão no mesmo nível do meu irmão.
― Pois você está errado! O
Fábio é o máximo! Ele deixa meu irmão comendo poeira!
― Calma, Nando. ― disse
Carla, um tanto assustada com a agressividade das afirmações do
garoto. Porém a discussão foi interrompida nesse momento.
― Fernando, Daniel e Carla! É
ótimo encontrar vocês! Eu estava maluco procurando qualquer um da
galera pra mostrar isso! ― disse Tiago, se aproximando e sentando
na cadeira desocupada.
― Tiago! Bem na hora! Fala
pro Nando parar de viajar! Ele está tão fanático pelo meu irmão
que já estou ficando assustado!
― O cara é o melhor! E ainda
conseguiu uma namorada! É algo inacreditável!
― Ele pode até ter
conseguido uma garota, mas eu consegui algo ainda mais incrível. ―
gabou-se Thiago, com um sorriso ardiloso.
― Do que você tá falando? ―
perguntou Daniel.
― Heh. Preparem-se para
conhecer o site que mais vão gostar de ver ao final de cada dia de
treinamento, de hoje em diante. ― anunciou Barbosa, antes de abrir
o navegador projetado na mesa.
Levou alguns instantes para que
os três entendessem exatamente o que estavam vendo. Mas não demorou
nada para que uma algazarra fosse feita ao chegarem à resposta.
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